Em julgamento concluído na última terça-feira (21/10), o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou tese com repercussão geral no Tema 1.266, determinando que a cobrança do ICMS com diferencial de alíquota
Em julgamento concluído na última terça-feira (21/10), o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou tese com repercussão geral no Tema 1.266, determinando que a cobrança do ICMS com diferencial de alíquota (Difal) nas operações interestaduais destinadas a consumidores finais não contribuintes do imposto está sujeita à anterioridade nonagesimal apenas, mas modulou os efeitos da decisão. O julgamento foi proferido no âmbito do Recurso Extraordinário n° 1.426.271 e encerra um longo impasse envolvendo a aplicação da Lei Complementar nº 190/2022, norma que regulamentou a cobrança do Difal.
O Diferencial de Alíquota do ICMS (Difal) foi introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015 com o objetivo de equilibrar a repartição do ICMS entre os estados de origem e destino em operações interestaduais com consumidores finais não contribuintes. Antes da mudança constitucional, todo o imposto ficava com o estado de origem da mercadoria. Com a EC 87/2015, passou-se a dividir a arrecadação entre os entes federados envolvidos, obrigando o contribuinte a recolher o valor correspondente à diferença entre as alíquotas interna e interestadual.
A controvérsia surgiu porque, nos anos seguintes à emenda constitucional, os estados passaram a regulamentar e exigir o Difal por meio de atos administrativos, como convênios e portarias do CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária). Esse modelo foi contestado judicialmente, até que o STF, no julgamento conjunto da ADI 5.469 e do RE 1.287.019 (Tema 1.093), declarou que a cobrança do Difal exige lei complementar, não sendo possível sua instituição apenas por atos infralegais. Foi com a Lei Complementar n° 190, sancionada em 4 de janeiro de 2022, que se passou a regulamentar formalmente a cobrança.
Com a promulgação da LC 190/2022, nova controvérsia surgiu, dessa vez sobre o período para sua entrada em vigor. Diante da dúvida, contribuintes e estados da federação foram ao STF questionar o momento da entrada em vigor da referida lei. De um lado, estados defendiam a cobrança do Difal já a partir de janeiro de 2022, enquanto contribuintes sustentavam que seria necessário observar os princípios constitucionais da anterioridade anual (esperar o exercício seguinte) e da anterioridade nonagesimal (aguardar 90 dias após a publicação da lei). O STF enfrentou essa controvérsia no julgamento conjunto das ADIs 7.066, 7.070 e 7.078, quando validou o artigo 3º da LC 190/2022, que estabelece que a cobrança só é permitida após 90 dias da publicação da norma, ou seja, a partir de abril de 2022. O tribunal, no entanto, afastou a necessidade de anterioridade anual, por entender que a LC 190/2022 não criou ou majorou tributo, mas apenas regulamentou um já existente.
No julgamento do Tema 1.266, o Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de que a cobrança do Difal do ICMS está sujeita à regra da anterioridade nonagesimal, mas não exige a observância da anterioridade anual. Ao analisar o caso, a Corte reconheceu a constitucionalidade do art. 3º da LC 190/2022, validou as leis estaduais editadas após a EC 87/2015 que previam a cobrança do Difal, mas limitou os efeitos dessas leis à vigência da LC 190/2022, ou seja, a partir de 4 de abril de 2022, respeitando o prazo constitucional de 90 dias para a cobrança de impostos.
Em atenção à segurança jurídica, o STF também modulou os efeitos da decisão do Tema 1.266, determinando que os estados não poderão cobrar o Difal relativo ao ano de 2022 dos contribuintes que não realizaram o recolhimento e que ingressaram com ação judicial até 29 de novembro de 2023, data do julgamento da ADI 7.066. A modulação busca proteger empresas que estavam em dúvida sobre a obrigatoriedade do pagamento, especialmente diante da ausência de definição clara sobre a vigência da lei complementar até aquele momento.
Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter afastado a aplicação da anterioridade anual à Lei Complementar nº 190/2022, o julgamento do Tema 1.266 buscou preservar, em alguma medida, a confiança dos contribuintes no sistema tributário ao modular os efeitos de sua decisão. Ao resguardar aqueles que não recolheram o Difal em 2022 e que judicializaram a controvérsia até novembro de 2023, a Corte reconheceu a incerteza legítima que perdurava sobre a exigibilidade do tributo naquele período. Para o contribuinte, essa modulação termina como um consolo, onde ao menos se viu um esforço de manter a previsibilidade e a estabilidade das relações jurídicas, resguardando a segurança jurídica em contextos de transição normativa e controvérsias interpretativas relevantes.


